Saturday, November 9, 2013

Arcade Fire "Reflektor"

Confesso que nunca fui grande apoiante dos Arcade Fire. Não sei bem porque, mas nunca me suscitaram tanta admiração ou sequer o mínimo de interesse. Pareciam-me mais uma daquelas bandas que estavam na berra, que o pessoal do teu círculo de amigos com gostos musicais alternativos ouviam na altura e te espetavam com as músicas mais populares, seja do álbum de estreia "Funeral", passando ainda por "Neon Bible" e, sem dúvida que, tal como eu, ainda levaram com o "The Suburbs" até se fartarem.
O facto de serem imensos membros confundia-me, as fatiotas, no limiar do vintage e do bom gosto, assustavam-me e, instrumentos como o acordeão, a harpa, o xilofone, o mandolin ou, um instrumento de que só agora tomei conhecimento, o hurdy gurdy, faziam parte de todo este cenário ambulante. Tudo me parecia como que uma grande peça de teatro, a ponto de se parecerem como um daquelas bandas filarmónicas que tocam nos bailaricos da terra natal. Nada mesmo me impelia a ir de encontro a eles.
Vi-os, aliás, ao vivo uma única vez, aquando do Super Bock Super Rock 2011, no Meco. No entanto, de pouco me lembro desse concerto, sem ser que o som estava péssimo para quem estava cá atrás do recinto e que muitos dos seus fãs teriam o dobro da minha tenra idade na altura.
Hoje em dia, mais do que nunca, arrependo-me deste meu pouco entusiasmo e falta de interesse. O novo álbum dos Arcade Fire, o "Reflektor", acabado de sair, despertou em mim uma forte admiração por todo o trabalho musical deste grupo, como nunca antes nenhum o tinha feito, fazendo os críticos musicais delirarem e lançando o álbum direitinho para o primeiro lugar das tabelas. O álbum em si, está espectacular, sendo o single homónimo uma excelente escolha de o apresentar ao mundo. Para este álbum os Arcade Fire trabalharam com James Murphy dos recém-sepultado (mas prestes a renascer das cinzas, segundo correm os rumores) LCD Soundsystem, pelo que é possível notar-se algumas influências do denominado inditronica ou alternative dance, ou o que lhe queiram chamar. Win Butler, vocalista e um dos letristas principais, conta que a influência para este álbum partiu muito do filme de Marcel Camus, "Orfeu Negro", datado de 1959, e de um ensaio denominado "The Present Age" da autoria do filósofo dinamarquês, Soren Kierkegaard.
"Reflektor" é, sem dúvida, uma reflexão para um novo mundo dos Arcade Fire, uma implosão de sonoridades, variando entre as batidas dancáveis e um ritmo transparente e calmo. As letras que retratam toda a dinâmica dos relacionamentos e do que é o amor nos dias que correm "Trapped in a prism, in a prism of light, alone in the darkness, darkness of light, we fell in love, alone on a stage, in the reflective age", recorrendo a letras simples e metáforas com as quais nos podemos identificar. E "Afterlife" é, igualmente, um exemplo máximo disso, de uma letra e sonoridade simplista mas facilmente identificável, e a minha preferida de todo o álbum. É como que um deambulo para o que há depois do fim, "Afterlife, I think I saw what happens next, it was just a glimpse of you, like looking through a window, or a shallow sea, could you see me?".
Em "Awful Sound (Oh Eurydice)" e "It's Never Over (Oh Orpheus)", as personagens do filme de Marcel Camus ganham vida nesta interpretação musical dos Arcade Fire, na busca pelo amor, numa espécie de Romeu e Julieta dos tempos modernos. Em "Porno", ao contrário do que o nome nos sugere, nada mais é do que a continuação dessa procura pelo amor, mesmo depois da ruptura, numa espécie de resposta ao "Afterlife": "You say love is real, like a disease, come on tell me please, I'm not over it".
As restantes faixas do álbum são igualmente soberbas, como, por exemplo "We Exist" e "Normal Person", que retratam os problemas da alienação e exclusão, em "Joan Of Arc" vemos uma declaração de amor fiel, e, com "Here Comes The Night Time", "Here Comes The Night Time II", "You Already Know" e "Supersymmetry", vemos uma crítica à sociedade de hoje, caído entre o entusiasmo momentâneo e a indolência sem paixão, nas palavras de Sorren Kierkegaard. "Flashbulb Eyes", por sua vez, recai sobre a imprensa generalista.
O álbum "Reflektor" leva-nos a viajar numa outra dimensão musical onírica, uma projecção para um outro espaço que só os Arcade Fire conhecem. Talvez agora possamos recorrer a palavras como "arcadianas" para descrever momentos únicos como estes.



A única recordação que guardo da passagem dos Arcade Fire pelo Meco. Mesmo não sendo fã, consegui o horário deles por intermédio de um dos seguranças que me confundiu com uma fã histérica, em vez de uma bêbada que tem por gosto falar alto.



No comments:

Post a Comment